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AntiAutoAjuda - 2019

by Manger Cadavre?

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1.
Chegou o dia em que travou. Sua mente embaralhava e seu corpo não se movia. Estava com tudo arrumado e de acordo com as normas, de banho tomado, nos conformes para repetir mais um dia de trabalho... exceto sua vontade. A repetição da reprodução de um trabalho precarizado, da venda à um valor patético do seu único bem, do seu bem maior, o tempo, fazia que antevisse o fracasso. Era ainda mais desvalorizado com mensuração de produtividade, por uma eficiência em satisfazer com mentiras os danos que aquela mesma célula produzia propositalmente. Conversão. Como odiava essa palavra. Sentia-se uma peça com defeito... não havia satisfação alguma ao receber o prêmio por ter tolerado aquelas horas diárias de tortura. Pagar contas, consumir, ostentar o mínimo do mínimo de entretenimento que a bonificação por metas (à duras penas) atingidas (quando atingidas) trazia, não gerava felicidade alguma. E se a bonificação não vinha, deixava de ser sujeito. Recebia olhares de reprovação, sentia-se um estorvo. “Você não pensa na equipe”, mas a equipe não enxergava a sua existência. “Você não pensa em dar o melhor para sua família?”. Tentava por eles, não por si. Eventualmente falhava e as dimensões mercadológicas subjetivas das relações, mais uma vez anulavam o seu ser. 1- Patologia Sistêmica Fadados a ser submetidos a viver uma vida não viva. Vida que vaza e coisifica - enumera e produz patologias, mal estar. Toma os corpos ao mercado, destinando a viver acelerados, engolidos, dilacerados. Consumidores de acontecimentos, presos no pesadelo da repetição. Anomalias, alterações estruturais devem ser sanadas com pílulas para ligar e desligar: desconectar da realidade pra trabalhar, para o outro ganhar. Gerar: Mais Mais Mais (SEMPRE) Mais Mais Lucro
2.
Após engolir as pílulas receitadas para que “voltasse a ter força de vontade”, que pudesse repetir suas obrigações diárias, refugiava-se, entretia-se com a realidade virtual, de vidas que só existiam aí: dentro da web. Pensava sobre a plasticidade que aquela felicidade alheia exibia. Talvez elas fossem reais, apesar de bizarras... Mas quase acreditava que poderia invejá-las. Seria tão mais fácil estar dentro do padrão. Tinha medo do julgamento, quase não se expunha pois temia o olhar o outro. Não tinha o aparelho X, o corpo Y, o reconhecimento, não sabia o que era vencer aos moldes pré-estabelecidos. Fazia um esforço comovente pela ignorância e a anestesia, mesmo com todo o medo de sentir. E as pessoas... com ou sem a tecnologia, sempre foram cruéis. Essa crueldade tinha deixado chagas que nunca cicatrizaram, mas pararam de arder. As necessidades básicas (que deveriam ser garantidas) privadas, a indiferença alheia, a culpabilização (“se tivesse se esforçado, tinha conseguido”, ouviu a vida toda), a competitividade... eram tantas e em diferentes formas de materialização, que a única lição que aprendeu desde a infância era que o que queria não importava... precisava vencer na vida. Não venceu. Só reagia, para evitar os maiores medos. Seus demônios que voltavam para assombar em noites em que a insônia assolava. 2- Produtos do medo Hiperconectividade (e) Novas formas de consumo (um) mundo que cria inseguranças as tem como alimento ao povo Capitalismo cria medos Publicidade vende a "solução" Receitas pra felicidade obrigatória Aos moldes do mundo do desempenho Uma Distopia Liberal Real O mal estar quer nos dizer que algo está muito errado É preciso se mover, escapar de ser acorrentado ao desejo do Outro, que não é a nossa escolha. Em condições reguladoras, de gestão da auto opressão, Condições insuportáveis, em uma versão de Escravidão contemporânea, (Que) nos reduz e a chaga é a depressão
3.
Fracasso 01:47
Tentou durante mais alguns meses. Eram espasmos de movimento... mas eram espasmos tão rápidos, que parecia que estava caminhando. Na realidade estava em paralisia... Nunca tinha saído daquela porta, quando seu corpo disse não. A vida era desconectada com a realidade, os contatos não estabeleciam contatos, os toques, não comoviam, não tocavam. Eram gélidos, como a indiferença que o individualismo de cada um transmitia. Pediu afastamento pelo órgão que o senso comum dizia que não deveria existir e aqueles que estavam no poder (de forma ilegítima), comissionavam médicos para indeferir pedidos. Não conseguiu. Insistiu. Todos ao redor já julgavam, era um absurdo perder o controle... A máquina fazia miseráveis, produzindo e reproduzindo a pobreza e o vazio. 3- Fracasso Tudo parece ter sido em vão Esqueço o mundo, ignoro a razão Era pra ser, não foi Sensação de vazio corrói. Não Mudará Não Mudará Não Mudará Não Mudará
4.
Quando você já não tem nada, nada mais importa. Conseguiu afastar-se do ambiente que lhe era tóxico. Teria pouco tempo para passar pela manutenção, consertar-se para voltar a fazer parte da máquina. Mas sentia um certo alívio em não ser uma engrenagem. 4- Caminhos de ferro Não pertencer ao que só existe Dentro dessa máquina que dirige, define... Acelera a urgência em viver a vida de desejos impostos: - Percursos definidos - Metas à alcançar < Automatização do sentir > Anseio sair dos trilhos Tentar parar Cedo, perco os sentidos Como recuar? Na trilha pré definida (para) nenhum lugar Não me levarão à pontes.
5.
Hostil 01:57
O tempo passou e se esgotou. Era voltar para a máquina ou ser descartado. Se viu obrigado a sair. Se colocaria fora do tempo dos outros, da velocidade da máquina e todas as suas autoridades. Desistia de enquadrar-se, desistia de si mesmo. Se já não era sujeito, se já estava invisibilizado por não ser produtivo, se recusou a seguir nesses trilhos de automatização. 5- Hostil Quando Relações são superficiais Escolho sentir Se nos querem viciados Mantenho a lucidez A felicidade vem da ignorância Escolho a desilusão Quando a vida vem de coisas palpáveis Escolho estar morto Morto Fiel a mim mesmo Morto, sendo honesto Já mentimos, traímos demais Roubamos a nossos próprios irmãos Que talvez, tenham feito o mesmo Nos deixamos levar Por uma onda Em uma zona cômoda Na qual estivemos sedados Para não percebermos O que estávamos fazendo Escolho estar morto Morrer e não apodrecer De cabeça erguida Morrer e não apodrecer E sentindo eu vou morrer. Quando a presença Se resume a existir Não quero apenas Sobreviver A vida (Inimigo) É mais (Contrário) Que o (Ofensivo) Coração Batendo (Hostil).
6.
Antes de partir, resolveu caminhar. Queria se despedir das coisas que amava... A música foi sua melhor amiga por toda uma vida. Nesse caminhar, deparou-se com um pequeno grupo... eles distribuíam um jornal, que se tratava de um sulfite com denúncias em fotocópias. Passou os olhos sem ler, mas fixou na afirmação: “Outro caminho é possível”. Seus olhos transbordaram esperança, quase como os primeiros pingos de chuva em uma estação seca e árida. 6- Desmascarar as mentiras "Esperança e sentido: sonhos Aceitar e acatar: metas O convívio coletivo é perda Sozinho e com o seu esforço, ganhar" Naturalizam violências Imobilizam resistências A burguesia prega o individual pois sabe da força do coletivo Que a levaria à ruína Desmascarando as mentiras Que fragilizam a consciência Com a exploração do medo Herança colonial escravocrata De uma elite parasita Estruturas imóveis rachadas Podem ruir Esquecer é dar controle (Não iremos esquecer) Outro caminho é possível É preciso nos reconectar
7.
Prefácio 02:23
“O inconsciente é política”, eles explicaram. E, continuaram: “Sua parte que ainda estava viva é que te causa o mal-estar... O mal-estar te salvou de viver uma vida no modo-avião, na qual os cidadãos de bem são cegos e surdos e com o discernimento gravemente afetado. Como ser indiferente em um mundo tão cruel, em que tanta gente sofre? Como subir vidros em semáforos, com medo da violência, onde a gente vê pessoas execradas pelo capitalismo? A herança colonial que perpetua o racismo estrutural. A rotina da exploração, que é uma violência naturalizada, esmagou o que a gente é, e coloca a solidariedade como sinônimo de caridade. Não é! Solidariedade é entender o outro como um companheiro, como um igual e lutar para que ele, para que nós tenhamos uma vida digna. Nos tornamos tecnicamente capazes de fazer coisas que não somos capazes de imaginar. Sonhar? Os tempos são difíceis, mas ainda é possível. E nesse momento é o mal-estar que nos acusa o que resta de humano em nosso corpo. Se livre das receitas prontas de felicidade contidas em guias e livros de autoajuda. Nós somos AntiAutoAjuda. Estar doente de verdade, é estar feliz em sua bolha, com seus privilégios, frente à um mundo miserável. Sentir-se mal, é sinal de excelente saúde mental!” 7- Prefácio O liberalismo vende a ideia do individualismo em que a livre-iniciativa e o mercado regulariam os desajustes sociais e econômicos trazendo ordem e paz No consumo, a felicidade Na acumulação, o bem-estar Mas só gerou concentração de riqueza da burguesia e aumento da pobreza Nos anulou frente ao capital Paralisados e adoecidos Se o sistema desampara Temos que buscar amparo e esperança em algum lugar E dessa combinação Rebeldia mobilizar Voltar a ouvir, voltar a enxergar Reconhecer os desejos, a totalidade E o "ser" perdido reencontrar
8.
Aprendeu sobre a história, pois um povo que não conhece seu passado está fadado à repeti-lo, andar no escuro. Aos poucos, entendeu a realidade... analisar a conjuntura atual era tão importante quanto. Apaixonou-se pela causa como se apaixona por uma pessoa. 8- Há tempo para os sonhadores Deixar apenas de reagir Estávamos limitados à isso. Temos que nos mover com consistência Pensar em estratégias e propósitos Passar a entender a nossa importância Na composição de uma resistência Que ousa propor que outro caminho é possível Ousar sonhar Ousar agir Ousar falar Ousar seguir As contradições existem e é preciso caminhar com elas e enfrentar as complexidades para se mover e mudar a realidade coletiva. Deixar apenas de reagir Estávamos limitados à isso. Temos que nos mover com consistência Pensar em estratégias e propósitos Para superar.
9.
E, então, reencontrou a força do seu desejo no próprio ambiente coletivo: a luta era a sua cura. Os seus semelhantes, que outrora humilhados, diminuídos, que estavam sozinhos e sofriam sozinhos, encontraram uma comunidade, um propósito comum. Os traumas da violência estrutural eventualmente pareciam tomar força novamente, mas no convívio social, resgataram o sentimento comunitário: poderiam contar uns com os outros. Ter descoberto que não estava só que poderia ser ajudado, mas principalmente, que poderia ajudar outras pessoas a lutar, trazia um sentimento de existir novamente (antes só resistia). A solidariedade se tornou uma via de mão dupla, onde antes só existia um trilho único. Resgatou seu sentimento de potência, se fez ouvir, ver, dizer... era alguém para aqueles muitos alguéns, que também representavam algo forte para si. Com a clareza das dificuldades, “A luta continua, companheiros”, era a frase que mais enchia seu coração. 9- A Luta como cura A cura está na luta Guiando o próprio caminho Junto aos companheiros que também escolheram os trajetos que levam a uma vida mais digna. As cicatrizes já não trazem a dor Mas lembram o passado de consciência sofrida com uma vida danificada, em uma situação precarizada. Juntos, aprendemos a lutar Juntos, temos a força para suportar as derrotas e avançar na ofensiva pelos direitos básicos e um outro mundo imaginar. A cura está na luta

about

Recorded & mixed by Family Mob Studios - Hugo Silva
Mastered by David Menezes
Backing vocals (A Luta Como Cura): Caio Augusttus
Artwork by Marcelo Augusto
All songs written by Manger Cadavre?

credits

released May 1, 2019

license

all rights reserved

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about

Manger Cadavre? São José Dos Campos, Brazil

Nata Nachthexen- Vocal
Paulo Alexandre - Guitarra
Marcelo Kruszynski - Bateria
Bruno Henrique - Baixo

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